segunda-feira, 30 de março de 2009

Na madrugada densa de chuva


Olhou a chuva na luz do poste pensando nela e em tudo que haviam conversado.
Quis ligar para saber como ela se sentia...
Mentira. Queria ligar para dizer a ela como estava se sentindo, pois não conseguia ter qualquer sensação e não contar a ela.
Sentir estava sempre relacionado a ela e aquela chuva torrencial o fazia sentir com mais intensidade.
Não queria olhar para dentro daquele quarto vazio, pois seria igual olhar para dentro de si mesmo e não vê-la sabendo que todos os seus livros e CDs estavam impregnados dela, do cheiro, do sorriso, da voz e da falta que ela faz.
Atravessou o quarto e desceu as escadas.
De repente viu-se na calçada ao pé do poste sentindo a chuva molhar seus cabelos que escorriam acariciando seu rosto.
Sentiu a camisa colando na pele.
Sentiu frio.
Sentiu-se vivo.
As gotas massageavam os músculos tensos de amor dos seus ombros, a dor foi passando e ele decidiu que nunca mais ligaria, nunca mais a veria em livros e CDs, nunca mais... Nunca mais.
Correu os poucos quarteirões que separavam sua casa da dela. Os tênis pesados de chuva, a pele arrepiada de frio e de ansiedade e os músculos tensos de amor.
Gritou seu nome na calçada sem se importar com a hora avançada da madrugada densa...
Ela estava na varanda e não se espantou ao ver o homem que amava naquela madrugada chuvosa...
Abraçou-o e o ouviu dizer que não a queria em livros ou CDs ou dentro de si. Queria-a nos braços, na pele, sob a chuva torrencial...
Iluminada pela luz de um poste na madrugada densa de chuva.

Foto de Roger Rodrigues – o futuro Historiador a quem dedico este humilde texto escrito ao som de True do The Frames.

Um comentário:

Poeta Mauro Rocha disse...

No silêncio da chuva a luz do desejo. Gostei desse texto.
BJS