terça-feira, 23 de junho de 2009

Acupuntura, Woody Allen e algo mais...


O que te afasta das pessoas?
E o que te aproxima delas?
Afinidades, diferenças, ideologias, carência, curiosidade, solidariedade, conveniência, solidão?
Esta vida estranha que vivemos... nem dá pra procurar motivos.
Às vezes a gente simplesmente esbarra em outra vida e pronto.
A partir daí começa uma longa história, ou apenas mais um ombro existencial no seu caminho que te faz pedir desculpas.
Atualmente vivo em uma grande cidade horrível, tenho sementes na orelha para tentar parar de fumar e juro que não vou me embriagar todo final de semana. Também juro que não vou mais cometer o erro imbecil de te ligar e passar por outra situação indigesta.
O que me aproximou de você?
Pra que ligar?
Eu sei que você não está aqui mesmo.
Eu disse que seria assim.
O que te aproximou de mim?
Sinto-me personagem de um filme do Woody Allen e isso é bom.
A coisa toda fica ruim quando eu me sinto personagem de um filme do Kubrick.
Talvez essas sementes me ajudem a parar de fumar e acabem com a minha gastrite e coloquem um fim nesta minha maldita ansiedade.
Mas, não há acupuntura nem nada neste mundo que me afaste destes ombros nos quais esbarro de vez enquando...
Nem ciência que me ensine a não te ligar e sentir meu estômago lutar contra todas as sementes do mundo quando não é a sua voz que eu ouço e me dou conta de que você não está aqui mesmo.
O que me afasta de você?
E eu aqui, tentando estabelecer outras prioridades e nunca mais abrir mão do meu precioso sono para ouvir a tua voz.
E eu aqui...
Tentando parar de fumar.
Mas, o cigarro, caro Caio F., é a única coisa que eu quero ter nas mãos agora.
Amanhã tentaremos com agulhas.
O que te afasta de mim?

sábado, 6 de junho de 2009

O pesadelo


Esta noite acordei com uma sensação estranha. Acendi a luz do quarto e notei ao me olhar no espelho que havia sangue por todo meu corpo.
Assustada, me apressei em descobrir de onde vinha todo aquele sangue. Procurei por baixo do pijama que se colava à minha pele, entre as pernas, na barriga, nas costas... Até que empurrei meus cabelos para trás e pude ver os fios que escorriam incessantemente dos meus ouvidos.
Pensei consternada que as palavras que ouço são realmente muito agressivas para provocar feridas assim.
É que às vezes eu me canso de ser tão perecível.
É que às vezes essas agressões precisam ser expelidas de alguma maneira, mas eu não imaginei que seria uma hemorragia no meio da madrugada.
Sentia o calor dos fios de sangue escorrendo pelas minhas orelhas, sentia o sabor das palavras que ouço descendo pelo meu pescoço, sentia o cansaço das vozes manchadas de sangue e abandono.
Havia muito sangue. A agressão acumulada da semana. O cansaço de todas as vozes do mundo, de todas as discussões improfícuas, de todos os telefonemas ridículos, de todas as saudades inócuas...
Até que os fios de sangue cessaram.
Entendo estes mecanismos.
Às vezes minha mente precisa criar esses pesadelos para curar as feridas da semana.
Isso é o que eu chamo de “mal necessário”.
O pesadelo acabou.
Não há mais sangue.


Tela: "O Pesadelo" (1781), de Henry Fuseli