quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

TPM


Sim, eu sofro deste mal...
Alguém me diz:


- O que você tem é falta de fé... Deveria orar a Deus e implorar pra que ele faça de você uma pessoa mais tolerante, tranqüila, otimista e livre de pensamentos psicóticos.

Tento explicar que fé eu tenho... Mas também tenho hormônios e, estes filhos da puta sim, são ateus... Substâncias sem Deus, sem fé, sem religião, sem sentimentos, desalmados e desgraçados.

Difícil explicar as peculiaridades ateísticas do meu organismo... Desisto.
Fico quieta... logo passa.


Abraço.

sábado, 13 de dezembro de 2008

DIAGNÓSTICO


Sua mãe afaga seus cabelos enquanto ela sonha um sonho ruim com uvas sem cor ao som de Carmina Burana. Estranha música para a menina ouvir num sonho...
Em pouco tempo o médico chega... Diz que a menina acordou e recebeu a notícia, chorou lágrimas da mais profunda consternação e depois voltou a dormir.
A realidade está muito escorregadia. Ela deve ser cuidadosa, evitar músicas, poemas, fotos... lembranças. Ou pode cair.
Apesar do diagnóstico devastador, sente-se segura pela presença do médico. Ele a curou da escuridão que a impedia de respirar.
E é Natal, os presentes já se anunciam! Pretende se afastar desse universo traiçoeiro por alguns dias... Talvez consiga esquecer...
Às vezes sinto muita pena dela...
A menina está tão confusa... Se ela ao menos não se cansasse tanto para tentar entender... Gostaria de poder lhe dizer que não há explicação plausível para o diabetes.
Mas a menina já não tem a companhia do Grande Gato Amarelo de palavras sábias... e seu médico desistiu de negar-lhe a doença.
Voltou a ter pesadelos e o que mais a atormenta é saber que sua doença não tem cura...
Não nos esqueçamos: é Natal... e o presente anunciado deverá ser um bom paliativo.
Alegrar-se-á com ele.
Afinal, diabetes não é uma doença tão grave... pode ser controlada.
Só é preciso acostumar-se a viver sem doces por toda sua vida.
O médico é muito atencioso com os pais aflitos:
- A menina vai sobreviver... Deixem-na falar palavrões, fará muito bem a ela. Façam-na profissionalmente promissora, isso pode distraí-la por algum tempo, mas caso ela demonstre enfado, esqueçam o Serviço Social e tentem expressar satisfação quando disser que está indo embora para a Escócia trabalhar como garçonete. Apenas se certifiquem de que fez um bom curso de inglês antes, ou a experiência será desastrosa. Nunca critiquem suas roupas e músicas anacrônicas, ela pode debilitar-se fatalmente. Dêem-lhe todos os bons livros do mundo... é a garantia de seu bem-estar. Não deixem que passe muito tempo sem ouvir Noel Rosa – o Poeta da Vila faz tudo ficar mais leve. Vai precisar de doses diárias de vaidade e, embora tenha efeitos colaterais lamentáveis, este ainda é o único medicamento contra a frustração. Vigiem cada molécula de seu corpo, elas estão frágeis como um passarinho. Deixem-na dedicar-se ao comunismo se ela quiser – não deverá fazer-lhe mal nenhum – contanto que não se transforme numa stalinista miserável ou em uma sindicalista decadente (se isso acontecer teremos que sacrificá-la). Nunca velem seu sono, se o fizerem ela sentirá e terá novos pesadelos. Não lhe ofereçam flores, a doença desencadeou uma espécie de alergia que pode ser temporária – ainda não sabemos... E não tentem privá-la da solidão, pois é essencial ao tratamento.
A mãe, com lágrimas nos olhos, pergunta:
- Ela sente dor?
O médico responde prontamente e com um sorriso de complacência:
- Sim, mas é bem menor do que parece...
O pai fala sobre o Grande Gato Amarelo e o médico lembra-se que a menina havia perguntado por ele. Mentiram-lhe a pedido do médico, que acreditou ser desnecessário dar à menina outra notícia tão desagradável... Disseram que o sábio felino se cansou da empáfia dos brasileiros, filiou-se a um partido parlamentarista australiano e foi trabalhar como atendente de farmácia numa cidadezinha ao leste da Tasmânia. Ela pareceu não dar importância... mas balbuciou algum impropério por causa da “promiscuidade política do animal”.
Assim que acordasse iria para casa.
Os pais se olham no corredor e decidem cuidar dos aspectos práticos: a mãe ficaria esperando a filha acordar enquanto o pai iria rapidamente para casa enterrar o maldito Grande Gato Amarelo, para depois correr até a livraria comprar algumas obras de literatura russa.
Olho-a pelo vidro da porta, ela ainda sonha com as uvas...
A menina vai sobreviver.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

O Mundo é um Moinho


Ainda é cedo, amor

Mal começaste a conhecer a vida

Já anuncias a hora da partida

Sem saber mesmo o rumo que irás tomar


Preste atenção, querida

Embora eu saiba que estás resolvida

Em cada esquina cai um pouco a tua vida

Em pouco tempo não serás mais o que és


Ouça-me bem, amor

Preste atenção, o mundo é um moinho

Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos

Vai reduzir as ilusões à pó.


Preste atenção, querida

De cada amor tu herdarás só o cinismo

Quando notares estás a beira do abismo

Abismo que cavaste com teus pés.



(Cartola).



Tem dias que essa música parece um hino aqui em casa... e ouço-a na voz do Cazuza, que é pra doer um pouco mais.

A imagem é de alguém que, as vezes, ainda contesta o Cartola.



Abraço.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

E ela só queria ser uma tempestade...


... a agitação violenta da atmosfera.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

A Corujinha


Corujinha, corujinha,

Que peninha de você.

Fica toda encolhidinha

Sempre olhando não sei quê.

O seu canto de repente

Faz a gente estremecer.

Corujinha, pobrezinha,

Todo mundo que te vê

Diz assim, ah, coitadinha,

Que feinha que é você.


Quando a noite vem chegando

Chega o teu amanhecer.

E se o sol vem despontando

Vais voando te esconder.


Hoje em dia andas vaidosa,

Orgulhosa como o quê.

Toda noite tua carinha

Aparece na TV.


Corujinha, corujinha,
Que feinha que é você.

(Vinícius de Moraes e Toquinho).
Adoro corujas...
Adoro Vinícius... em parceria com Toquinho é o que há de melhor...
E essa musiquinha é um primor na voz da Elis.
Até mais.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

The Kiss


Há quem diga que eu não sei amar... Tenho, ao invés disso, “ataques de inspiração literária”. Quiçá seja verdade... nesta arte eu sou desastrosamente inábil. Embora literariamente eu também não tenha nenhum encanto...
Mas, acredito que o amor inspira a escrever, principalmente quando causa aquela dor azucrinante que o Chico quis curar com aspirina...
E, para o caso do leitor não gostar do texto (que por vezes me parece piegas ou grotesco, além de prolixo) a tela que acompanha esta postagem é algo realmente digno de ser contemplado: “The Kiss” - de Gustav Klimt.

Um dia, de repente, você será o amor que não respeita decisões...
Um dia você será a voz que acompanha o violão enquanto estou no chuveiro...
Um dia você será o homem que me fará rir de suas bobagens depois do amor...
Um dia você será a única coisa que vou querer depois de um dia inteiro de trabalho...
Um dia você será tão indispensável quanto o samba e a cerveja...
Um dia você será tão bom quanto a sensação de estar magérrima...
Um dia você será todo diversão...
Um dia você será a coisa mais louca que eu já fiz...
Um dia você será a minha imagem refletida nos olhos de quem não pode me ver...
Um dia você será o grito da Janis...
Um dia você será a atmosfera insalubre do bar...
Um dia você será a batida de um samba novo...
Um dia você será o cigarro entre meus dedos trêmulos...
Um dia você será o nascimento de outra vida...
Um dia você será a única criatura que terá acesso irrestrito ao meu corpo e à minha alma...
Um dia você será o homem que eu vou querer matar nas tardes insuportáveis de TPM...
Um dia você será aquele que me fará agradecer a Deus por estar viva ao sentir seu abraço...
Será o homem que me ensinará a usar vírgulas...
Será o homem que fará meu corpo implorar pelo teu...
Será o sexo proibido no banheiro do bar...
Será o deleite desta lembrança...
Será eterno entre minhas coxas...
Será o olhar humano que consome...
Será imaculado em minhas calcinhas...
Será o homem para quem meus gemidos serão a expressão maior de que não dá pra viver sem saber o que é “trepar com amor”...
Será o homem com que vou brigar... para depois passar a noite toda me reconciliando...
Será os braços nos quais vou adormecer...
Será o peito sobre o qual vou me deitar para ouvir por muito tempo a cadência gostosa do teu coração...
Será a tarde preguiçosa no domingo inebriado de violão e cerveja...
Será o gosto do vinho na minha boca quente...
Será a marca indelével da vida no meu corpo...
Será a entrega única... que passa singela entre livros e discos e a bagunça do meu quarto...
Será o telefonema no meio da noite que vai calar meus palavrões...
Será, de repente, o sorriso de menino que vai me fazer esquecer as horas e as obrigações...
Será um mundo a parte...
Será minha única fantasia...
Minha única realização...
Minha maior vaidade...

Um dia, de repente, você será a boca mais desejada...
Será a saliva que me alimenta...
Será a língua na minha nuca... o choque e o arrepio da alma...
Será a respiração morna na escuridão...
Será o peso das pernas sobre as minhas nas noites insones...
Será o sexo de brincadeiras... de experimentações de cheiros e gostos e posições e lugares...
Será a risada incontida...
Será o gozo indiscreto...
Será a fúria de mãos e pernas e boca acompanhando palavras obscenas...
Será a mansidão do coração acompanhando palavras de amor...
Será o menino que chora nos meus braços...
Será o homem que vive nos meus olhos...
Será o amor que já não sofre...
Será a saudade que nos sorri...
Será o instante de uma vida inteira...
Será o bater de asas da borboleta...
Será o amor e todos os outros demônios...
Será o anjo que me devora...
Meu abrigo de paz...
Minha promessa de felicidade...

Hoje...
Você é o homem que minhas mãos procuram trêmulas...
Você é o grito contido na garganta...
Você é a saudade que me arranha...
Você é o meu sorriso quando alguém me diz Bom Dia...
Você é o amigo que me agüenta as lamúrias...
Você é a única voz desafinada que eu gosto de ouvir...
Você é o sotaque que me faz lembrar a distância...
Você é a lembrança do que fui um dia...
Você é a imagem do futuro incerto...
Você é sombra de árvore frondosa na pescaria...
Você é um conto...
Você é La Valse d’Amelie...
Você é o meu medo da morte...
Você é uma confusão...
Minha coragem recém nascida...
Uma briga de bar...
Um fim de noite na delegacia...
Você é a maquiagem borrada...
Você é um par surrado de AllStar...
Você é o sono insuportável no trabalho...
Você é a multidão sem sentido do samba...
Você é a bebedeira decadente...
Você é a inquietação do fígado no dia seguinte...
Você é o gosto amargo na boca...
Você é a motivação da minha última dieta...
Você é o meu TCC...
Você é a Humanização às avessas...
Você é uma política pública... sem diretrizes...
Você é a lágrima que me escapa nos momentos mais inoportunos...
Você é a minha seriedade...
Você é a minha fé...
Você é o meu amanhecer sonolento...
Você é o samba do Vinícius...
Você é a dança desajeitada do Jair...
Você é os móveis deste quarto...
Você é a estrada bonita no entardecer, no caminho da faculdade...
Você é a descoberta de novos mundos...
Você é o milagre do sentimento gratuito...
Você é um infinito sobressalto...
Você é o anjo libertino que me fala indecências...
Você é o demônio que me fala de amor...
Você é a minha espera por este dia...
Você é a minha ilusão...
Você é o meu de repente...
Você é a minha única verdade...
Minha tentativa de negação...
Meu amargo desejo...
Meus medos em exposição...
Minha fragilidade mais íntima...

Você é minha maior invenção.


Um abraço a todos...
Até.

sábado, 6 de dezembro de 2008

Ocultos...


Vamos falar sobre o homem que criou esta bela jovem pálida e seus tentáculos, que acompanha o título deste espaço: Ray Caesar. Esta e várias outras obras são impressionantes pela beleza e harmonia de cores. Algumas são levemente “indigestas”, outras instigantes... Uma miscelânea de sexualidade e inocência, beleza e horror...
Nascido em Londres em 1958, o artista começou exibir suas obras aos 45 anos de idade, carregadas das experiências profissionais que adquiriu ao longo de sua trajetória como fotógrafo na ala infantil de um hospital.
Ao ver suas telas numa revista de arte de um amigo, pensei imediatamente em pedofilia. Quase todas as imagens são de crianças, algumas em posições extremamente eróticas, decotes e expressões sensuais. Mas, um olhar mais atento, um vasculhar mais “artístico”, um sentir mais humano... e pude perceber algo muito mais relevante nestas imagens. Muitas dessas crianças têm partes do corpo que não são humanas: garras, tentáculos, patas, fluídos, marcas... algo que tentam esconder nas cores e luzes do ambiente.
Lembrei-me do Cortazar, com seu personagem que vomitava coelhinhos e sua tentativa desesperada de escondê-los do mundo...
Quantos de nós escondemos tentáculos ou coelhinhos diariamente?
Somos convencionais e afáveis aos olhos da sociedade dia após dia... no trabalho, nas reuniões de família, no jantar com os pais do namorado, nas festas... Mas, todos temos nossos coelhinhos para vomitar em silêncio... Temos nossos tentáculos escondidos na balbúrdia de cores e sons e obrigações da vida.
Quem disse que os tentáculos são tão ofensivos?
Por que vomitar coelhinhos nos parece tão desagradável?
Quem foi o primeiro a se assustar com as garras de alguém, a ponto de proibi-las de serem expostas?
Quando foi que a hipocrisia nasceu?
Quem instituiu o feio e o perigoso?
Ray Caesar e Cortazar haveriam de responder estas inocentes perguntas...
Todos nós, de alguma forma, sabemos as respostas...
Pois todos conhecemos o roçar dos pêlos macios na garganta...
Todos sabemos o trabalho que dá esconder tentáculos...

Ótima semana a todos...
Até.

Primeira hora...


Timidamente inicio esta invenção...

Quem iria ler minhas frases sem vírgulas?

Gostei da estética... Apanhei para deixá-lo mais ou menos do jeito que queria... Minhas limitações...

Vamos falar sobre música, literatura, cinema, sociedade... "de tudo um pouco". Não que eu entenda dessas coisas. Será apenas um espaço para meus pensamentos errantes...

Explico o título: me formei recentemente e toda aquela loucura de trabalhos, provas, aulas e ultimamente o terrível TCC, se foram... e deixaram uma lacuna de tempo. Resolvi (re)inventá-lo com este espaço e mais alguns projetos que apresentarei aqui futuramente.
A tela é do pintor surrealista Jacek Yerka.

É isso... para algum visitante casual, desejo um ótimo final de semana.

Até a próxima...