quinta-feira, 30 de abril de 2009

NA NATUREZA SELVAGEM


Há quase dois anos me vi com um filme nas mãos sobre o qual não sabia absolutamente nada.
Resolvi vê-lo numa madrugada tranqüila.
Na Natureza Selvagem.
Há tempos não chorava tanto...
Nas cenas finais comecei um processo estúpido de auto-consolação dizendo mentalmente que tudo aquilo era obra de ficção, até que fui boicotada no meu intento pela foto de Chris McCandless, o rapaz que morreu em 1992 de inanição nos confins do Alasca e inspirou o jornalista e alpinista Jon Krakauer a escrever o livro Na Natureza Selvagem que mais tarde levou Sean Penn a fazer o filme homônimo.
Chorei muito tempo depois do fim do filme e fiquei bem uns dois dias de luto pela morte do sujeito que leu Thoreau, Tolstoi e London com o mesmo entusiasmo que eu lera na adolescência.
A triste história do rapaz me causou impressões densas e eu sempre me sentia muito mal ao pensar na forma como ele padeceu seus últimos dias. Ouvia sempre a trilha sonora do filme, li um pouco mais sobre Chris, voltei a ver o filme depois de algum tempo e nunca mais deixei de refletir sobre meus enviesados ideais de solidão contaminada pela imagem daquele menino...
E eis que neste último aniversário recebi o livro de Krakauer de mãos amigas.
Foram dias de tensão em que olhava para o livro sobre a cômoda do quarto – ansiosa por iniciar a leitura e temerosa por saber que a literatura sempre me afeta mais do que filmes e que poderia prever um vale de lágrimas muito maior para a obra de Krakauer.
Enfiei o livro na bolsa para fazer uma viagem de ônibus que me levaria a um compromisso importante. Estava nervosa e uma boa leitura poderia me acalmar.
Não é novidade que eu tenha me esquecido totalmente do compromisso já na primeira página do livro e por vários momentos já nem me dava conta de que estava dentro de um ônibus.
Krakauer não me fez chorar.
O jornalista foi sóbrio, coerente e honesto em seu relato expondo sua admiração e respeito pelo garoto e mostrando a opinião pública a respeito da triste história.
Apesar de também admirar a pureza impetuosa do rapaz, vi a coerência das críticas feitas por norte-americanos com relação aos equívocos, excessos e atitudes arrogantes dele para com a família, a sociedade e a Natureza.
No entanto, ao perambular pela rede em busca de mais informações sobre a história, me deparei com diversos textos expressando as mais diferentes opiniões sobre o caso polêmico.
Criticar ou apontar as falhas nas atitudes de Chris que o levaram à morte por inanição num canto ermo do planeta me parecem posturas naturais de pessoas que se orientam por princípios de prudência e bom senso. Porém, ver críticas as suas motivações, aos seus princípios e conceitos de vida me fez corar de raiva e indignação. Principalmente pelo fato de que tais expressões foram justificadas pela visão peculiar de quem se colocou no lugar dos familiares de Chris e entendeu o sofrimento destes.
Este post é simplesmente para dizer que eu jamais veria a história de Chris com olhos de mãe ou de filha ou de Assistente Social ou qualquer outro “papel” que eu possa assumir nesta vida...
Vejo aquele sorriso inocente e apaixonado com olhos humanos...
Vejo Chris como alguém que viveu de acordo com ideais e princípios legítimos, sinceros e puros...
Vejo Chris como um ser humano complexo e admirável, que cometeu seus erros, mas foi intensamente verdadeiro em sua busca por algo que lhe era importante.
E que fique registrado que eu teria orgulho de um filho com tamanha nobreza... Ao passo que teria sérios conflitos com filhos hipócritas, mesquinhos, frivolamente felizes e sufocados de bens de consumo.
A morte prematura deste rapaz levou sua vida à mídia, despertando opiniões diversas.
Deixo aqui minha admiração e meu respeito por um sujeito que aprendeu mais em 24 anos do que muitas pessoas inteligentes e simpáticas são capazes de aprender em 80.
Chris aprendeu a humildade...
Deixou de acusar e apontar erros alheios nos momentos derradeiros.
Este deveria ser o maior ensinamento dessa história...
O que me entristece – e deve entristecê-lo também – é ver que agora pessoas do mundo todo fazem isso com ele também. Julgam, apontam, acusam, rotulam... aviltam seus ideais em discussões improfícuas e medíocres.
É que o mundo se esqueceu de olhar para fora com olhos humanos...
É que essa sociedade civilizada esqueceu-se de olhar para seus cidadãos com olhos de gente...
Os olhos são sempre de pais, mães, irmãos, vizinhos, professores, advogados, médicos, padres...
Que sociedade é essa? Que tem sempre que nos rotular e julgar nossas fraquezas?
A Natureza Selvagem me parece muito melhor do que a Sociedade Civilizada.
A Natureza me parece muito Civilizada, enquanto a Sociedade me parece cada dia mais Selvagem.
Concordo com Thoreau, Tolstoi, London, Chris...
Entendo-os...
Acredito neles.
E se eu tivesse filhos, os presentearia com A Desobediência Civil e Walden quando completassem 15 anos...
E, ai deles se, depois disso, ousassem julgar os ideais de alguém.

A foto é de Christopher McCandless, encontrada em sua câmera junto com seus restos mortais em 1992 no Alasca.

2 comentários:

Zé, de sobrenome Forner disse...

Por que a gente não deixa nossa digital neste mundo? É uma passagem tão pequena...

Poeta Mauro Rocha disse...

A natureza urbana é mais selvagem...